segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Cardeal Pie: dever dos cristãos vendo a Igreja assediada pelos maus

Tapeçaria do Apocalipse. Castelo de Angers, França.
Tapeçaria do Apocalipse. Castelo de Angers, França.
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs




“Eu quero dizer bem forte, meus filhos, que hoje mais do que nunca a força principal dos maus está na fraqueza dos bons, e o nervo de Satanás entre nós é o esvaziamento do cristianismo nos cristãos. (...)

“A grande provação estará próxima, estará longe – ninguém o sabe, e não ouso fazer vaticínios a esse respeito, pois estou de acordo com Bossuet quando diz: ‘Eu tenho medo de pôr minhas mãos sobre o futuro’”. (Explication de l'Apocalypse, cap. 20. Edit. Lebel, T. m, p. 478).

Mas o certo é que, na medida em que o mundo se aproxima de seu final, os maus e os sedutores terão sempre mais vantagem: Mali autem et seductores proficient in pejus (II Timoth., III, 13).

Não se encontrará quase mais Fé sobre a terra” (Luc., XVIII, 8), ou seja, ela terá desaparecido quase completamente de todas as instituições terrenas.

Os próprios fiéis apenas ousarão fazer profissão pública e social de sua Fé. Divisão, separação, divórcio das sociedades em relação a Deus: isso é o que nos é dado ver por São Paulo como um sinal precursor do fim que irá se consumando dia a dia: nisi venerit discessio primum (II Thessal. ,I, 3).

A Igreja, sociedade visível, sem dúvida ficará cada vez mais reduzida a proporções meramente individuais e domésticas.

Ela, que em seu início dizia: “O espaço me fica estreito, abri espaço para mim onde eu possa morar”: Angustus est mihi locus, fac spatium mihi ut habitem (Is., XLIX, 20), verá seu terreno disputado palmo a palmo; será sitiada, assediada por toda parte; tão grande como foi através dos séculos, tentar-se-á reduzi-la na mesma proporção à pequenez.

Por fim, haverá para a Igreja na terra como que uma verdadeira derrota: “será dado à besta fazer a guerra aos santos e vencê-los” (Apoc., XIII, 7). A insolência do mal atingirá o auge.



Os mundanos dançam sobre os cadáveres das testemunhas de Deus. Biblioteca de Toulouse (1220-1270).
Os mundanos dançam sobre os cadáveres das testemunhas de Deus. Biblioteca de Toulouse (1220-1270).
Ora, nesse ponto extremo das coisas, nesse estado desesperador, sobre este globo entregue ao triunfo do mal e que será logo envolto pelas chamas (II Petr., III, 10, 11), o que deverão fazer ainda todos os verdadeiros cristãos, todos os bons, todos os santos, todos os homens de fé e coragem?

Aferrando-se a uma impossibilidade mais palpável do que nunca, eles dirão com redobrada energia, no ardor de suas orações e pela atividade de suas obras, pela intrepidez de suas lutas: ó Deus, ó Pai nosso que estais nos Céus, que vosso nome seja santificado na Terra como no Céu, que vosso reino venha a nós na Terra como no Céu, que vossa vontade seja feita sobre na Terra como no Céu: Sicut in cœlo et in terra Sobre a terra como no Céu!

Eles ainda murmurarão essas palavras e a terra sumirá debaixo de seus pés.

E, como outrora após um espantoso desastre, viu-se o Senado de Roma e todas as ordens do Estado irem ao encontro do cônsul vencido e felicitá-lo, porque ele não perdeu a esperança da cidade (Tit. Liv., L. XXII, n. 61); assim, o Senado dos Céus, todos os coros angélicos, todas as ordens de bem-aventurados virão ao encontro dos generosos atletas que souberam sustentar o combate até o fim, esperando contra a própria esperança: Contra spem in spem.

E então, esse ideal impossível, que todos os eleitos de todos os séculos tinham obstinadamente procurado, tornar-se-á finalmente realidade.

Nessa segunda e última vinda, o Filho entregará o reino deste mundo a Deus seu Pai; o poder do mal será precipitado para sempre no fundo dos abismos (II Corint., XV, 24); tudo o que não tiver querido assimilar-se, incorporar-se a Deus por meio de Jesus Cristo, pela fé, pelo amor, pela observância da Lei, será relegado à cloaca das imundices eternas.

E Deus viverá, e reinará plena e eternamente, não só na unidade de sua natureza e na sociedade das três Pessoas divinas, mas na plenitude do Corpo Místico de seu Filho encarnado e na plenitude de seus santos.

(Autor: Cardeal Louis-Édouard-François-Desiré Pie (1815 – 1880), “Discurso na solenidade da recepção das relíquias de São Emiliano, pronunciado na catedral de Nantes, 9 de novembro de 1859”, in Oeuvres de monseigneur l'évêque de Poitiers, Tomo 3, Bibliothèque Nationale de France)


Notícia histórica do Cardeal Pie


O Cardeal Luis Eduardo Pie (1815 – 1880), foi bispo de Poitiers, França, elevado ao Cardinalato pela brilhante apologia da infalibilidade pontifícia no Concílio Vaticano I. Ele ficou famoso pelo seu “ultramontanismo” [literalmente = além das montanhas, apelativo dado aos franceses defensores do Papado] e pela sua ativa apologia do reinado social de Cristo Rei.

No Grande Seminário de Saint-Sulpice, em Paris, se destacou na polêmica contra os eclesiásticos “galicanos” [defensores de falsas prerrogativas do governo leigo francês, ou “galo”]. Ele foi ardido pregador contra o liberalismo, o relativismo e o livre pensamento condenado pelos Papas.

Em 12 de julho de 1843 escreveu uma carta que definia sua orientação autenticamente católica: “O partido neo-católico liberal é um filho da Revolução; e a Revolução é satânica na sua essência”.

Foi vigário da catedral e vigário geral da diocese de Chartres. Em 28 de setembro de 1849, o Papa Pio IX o nomeou bispo da diocese de Poitiers, ilustrada pelo ensinamento de Santo Hilário, Doutor da Igreja.

Ele resumia sua ação com a frase de São Paulo: instaurare omnia in Christo.

Exerceu grande influência sobre o conde de Chambord, pretendente legítimo ao trono da França. Foi muito hostilizado pelos bispos favoráveis a uma conciliação com o liberalismo positivista anticristão. Esses bispos defendiam um carunchado e insincero “cristianismo moderado”.

O bispo de Poitiers lhes respondia que “o diabo se chacoalha violentamente no seio do cristianismo moderado”, o qual segundo ele, era uma das mais danosas formas de subversão.

Ele tentou influenciar o imperador Napoleão III e lhe abrir os olhos diante do perigo que crescia contra a Igreja e contra a sociedade. Após infrutífera audiência em 15 de março de 1859, Mons. Pie anunciou profeticamente ao chefe de Estado o fracasso de seu reinado. O imperador foi deposto em setembro de 1870 após catastrófica derrota contra a Prússia protestante e iluminista.

Mons. Pie comparava o contrarrevolucionário Papa Pio IX ao próprio Cristo dizendo que o furor do inferno e do laicismo se desencadeou contra o Pontífice. Ele punha no boca do governo francês as insensíveis e cruéis palavras de Poncio Pilatos: Ecce homo !

Ele preveniu bispos e governantes para a vinda não remota do Anticristo preanunciada pela dissolução geral da sociedade cada vez mais liberal.

Mons. Pie foi perseguido e condenado pelo governo. Em 1863, denunciava a perseguição anticristã dizendo:

“O objetivo da Revolução [se referindo em primer lugar à Revolução Francesa de 1789 e seus sucedâneos] é o esmagamento do cristianismo na vida pública, a derrubada da ortodoxia social.

“Destruir os últimos restos do edifício antigo da Europa cristã. E, para que a demolição seja definitiva, abater a pedra angular em volta da qual ainda poderiam se articular os últimos restos subsistentes.

“Eis a obra na qual convergem abertamente as mil vozes da impiedade da nossa geração: a caotização à qual nos assistimos”.

Em 29 janeiro de 1879 foi elevado à dignidade de Cardeal pelo Papa Leão XIII. Roma quis premia-lo pelo seu brilhante atividade no Concílio Vaticano em favor do dogma da infalibilidade pontifícia, felizmente aprovado.

O cardeal Pie – “meu Mestre”, dizia São Pio X – profetizou, e eis aqui alguns textos que é bom redescobrir nestes dias.

A concordância com as mensagens de La Salette e Fátima se impõe por si mesma e dispensa comentários.

(Fonte: verbete Louis-Édouard Pie, Wikipedia, e idem).


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